MEDO?...TERROR?....SOMENTE INSÓLITO!
Em África há um sortilégio
que não apenas o das belezas tropicais que nos extasiam…e deixam
embevecidos…estáticos… olhos presos… mente paralisada…
Há um sortilégio (?) permanente de ruídos estranhos e desconhecidos, de medos, de eriçamento de pêlos num arrepiar que paralisa…!
Há um sortilégio (?) permanente de ruídos estranhos e desconhecidos, de medos, de eriçamento de pêlos num arrepiar que paralisa…!
Quem vive no mato tem, por
norma, nas janelas (que não têm portadas), redes mosquiteiras que protegem dos
mosquitos (e outros insectos inumeráveis)…
Praga que não tem fim e, que pode até ser
bastante perigosa provocando umas febres graves: paludismo… e, mesmo em algumas
regiões, ainda mais grave como a malária negra(que pode ser mortal).
…Dormíamos… a noite ia alta,
nostálgico o choro da hiena que de vez em quando nos acordava, provocando
estranhos pressentimentos e … algum medo que não queríamos às vezes
interpretar…..
Mas naquela noite tudo foi
diferente, não impossível em África, mas horrível em terror…
Acordámos com um forte e
estranho ruído, permanente… continuado…
Era em tudo semelhante a um
cortar das redes mosquiteiras mas cada vez mais impressionante e mais
arrepiante.
Atentámos numa escuta longa
na expectativa de detectar donde vinha e o que seria tal ruído/mistério
e……porque não dizê-lo(?)…..ir adiando o medo…que a cada minuto mais sentíamos.
Que pensar? (se é que nessas
situações conseguimos pensar). Assalto?
O que podia parecer mais
provável mas que em África poderia ser tudo…
Não havia alternativa senão
tirar as pistolas do armário, respirar (com medo) e…ir saber o que acontecia. A
pele arrepiava-se-nos até ao limite, a curiosidade acicatava-nos e… havia que
agir.
Armas em punho, às escuras,
destrancámos a porta do quarto, hábito adquirido desde que vivíamos no “mato”,
numa plantação de algodão.
Transidos até aos ossos pelo
medo seguimos até ao fim do corredor, donde nos parecia vir o misterioso som.
De um lado ficava a porta da
sala, do outro a da cozinha.
Com o maior cuidado e o menor ruído optámos por abrir a porta da sala(também trancada)…….nada!
Com o maior cuidado e o menor ruído optámos por abrir a porta da sala(também trancada)…….nada!
…mas já apercebendo-nos que
tal “horror” vinha da cozinha. Aguardámos expectantes na tentativa de algo que
nos pudesse dar uma pista.
De repente apercebemo-nos da
luz acesa na cozinha que se filtrava pela fechadura da porta, igualmente
trancada…
Estranho! Não era hábito
deixar acesas as luzes interiores mas sim as exteriores à vivenda.
De imediato começámos a
aperceber-nos de um odor esquisito, até um pouco nauseabundo.
Era necessário agir e, com
alguma relutância, repentinamente, deu-se a volta à chave…
Ainda mais paralisados… o
insólito!
O cheiro e o zumbido eram
incríveis! Ainda hoje me parece senti-los ao recordar…
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… Milhares e milhares de
“formigas de asa”---como lhe chamávamos.
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Estas formigas, das muitas
espécies que existem em Moçambique, são muito frequentes porque saem da terra
quando chove e procuram a luz, num voo completamente louco.
Ora tinha chovido à noitinha
e, ao aperceberem-se da luz na cozinha, infiltraram-se por baixo da porta.
A cozinha era uma cuba negra
total e o cheiro atordoava.
Foi urgente fechar
imediatamente a porta.
Ainda não refeitos do susto
que nos tinha deixado mossa era necessário acalmar os ânimos e deixar funcionar
os neurónios……..O facto de não
ser tão pior do que se esperava(?)---não
consegue acalmar de pronto os pensamentos horríveis que nos transtornam e
paralisam…e, quem já passou por situações destas bem o compreenderá.
Tinha chovido à noite e as
formigas, ao saírem da terra, e vislumbrarem a luz por baixo da porta,
começaram a entrar em catadupa, milhares e milhares (sim…porque em África é
tudo em quantidade e em extensão bastante diferente do que acontece aqui… )e, a
cozinha transformou-se numa “cuba negra”, com um cheiro pestilento (de
cadáver).
Foi urgente fechar de pronto
a porta da cozinha…
Felizmente a despensa ficava
no exterior, porta com porta com a cozinha e, era aí que se armazenavam os
produtos, sendo que era imprescindível ter em quantidade e, até sempre à mão,
os insecticidas.
Rodeando a casa entrou-se na
despensa e, não me perguntem quantas embalagens de insecticida foram
despejadas… umas por baixo das portas, outras através das redes mosquiteiras….
O que foi possível.
Então foi esperar “a morte
das intrusas” algum tempo até se poder abrir a porta do quintal… sim porque era
impensável, durante alguns dias , a ligação ao resto da casa.
Juro-vos, que ainda hoje,
quando falo ou lembro este episódio, me parece sentir aquele cheiro…
Claro que, passado o pânico e
o horror daquela visão, seguiu-se a hilaridade pelo insólito da situação…
(principalmente pelas armas…).
Mas África faz-nos viver
tantas situações insólitas, por bem e por mal, que contando preencheríamos
várias páginas…
Talvez por todas estas
vivências eu diga que foram os melhores anos da minha vida.
Porque os acontecimentos
tinham um sabor especial, sem dúvida o medo mas a adrenalina de continuar.
E, para além destes medos,
neste caso caricato mas noutros bem horripilantes, co-existia a grandiosidade
de uma terra de maravilhas, de essências exóticas, de magia…com uma salutar
convivência entre a Natureza e as Pessoas, não só com os africanos e os seus
inúmeros dialectos como com a variedade de outros residentes de vários pontos
do mundo.
Há uma mágica especial quando
o sol se levanta bem como quando o horizonte se avermelha e ele começa, qual
bola de fogo, a esconder-se num rasto de sangue, impondo-se a
Noite---nostálgica, tenebrosa, mágica, langorosa.
É ÁFRICA!
Autora: Guiomar Casas Novas
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